segunda-feira, 24 de junho de 2013

A Paz é o fruto da Justiça....

A Paz é o Fruto da Justiça
Is. 32. 17 e 18; Jr. 29: 5-7

Por Jofre Macnelli


            Nunca tive tanto orgulho de ser brasileiro como nessas últimas semanas. Não porque nosso país está prestigiando uma Copa das Confederações e daqui a um ano uma Copa do Mundo, mas pelo despertar do povo brasileiro pela justiça.
            Não por mera empolgação popular, todavia é salutar o ter fome e sede de justiça. Nossa nação esta marcada, por toda a sua história,  pela mácula da corrupção, da roubalheira e da pilantragem.

Sede de justiça

Justiça, assim como vários outros conceitos presentes no AT, tem suas raízes em outras culturas; está ligada a ideia de uma realidade cósmica como “ordem do mundo” (criada e sustentada pelos deuses). Exemplos: Mesaru – para a antiga Babilônia; Me – para os sumérios; Maat – para os egípcios.
Para os israelitas esta ordem cósmica é conhecida como sedeq – justiça é o mundo em ordem; o mundo é, portanto, ordenado em justiça.
Na Bíblia, as palavras shalom, mishpat e sedaqah (paz, direito e justiça) mantêm uma relação estreita. Para alcançar o shalom (paz) é necessária a prática da justiça. No entanto nossa tradução da palavra shalom é muito pobre, limitada, visto que esta no hebraico tem seu sentido mais amplo, pois essa paz se estende tanto para a paz privada ou pessoal, para a paz pública da comunidade, do bairro, da cidade, do país.
Por isso estamos passando por tudo isso hoje em nosso país. Digo que demorou pois é muita corrupção em um país de tantas riquezas naturais e de grandiosidade continental que tem na frente de sua máquina pública uma série de homens e mulheres interesseiros que busca o interesse próprio em detrimento ao público.
Quando pensamos em paz devemos levar em consideração a totalidade de sua etimologia, deve ser compreendido a partir de uma de suas raízes: shlm, que significa “totalidade”, tanto no sentido de não faltar nada como no de estar intacto. Representa, portanto, um estado de integridade, harmonia, inteireza e unidade.
Mas antes que alguém pense que o nosso país vive em “paz” e que na verdade a desordem que há são dos baderneiros e vândalos que estão nas ruas. É importante deixar claro quem é quem no meio dessa massa – Manifesto pacífico x vandalismo – coisas totalmente diferentes e inclusive mostra o despreparo de alguns manifestantes e oportunidade de outros (bandidos) de furtarem, destruírem e danificar o bem e espaço público.
Quando falamos de shalom não deve entender como a simples ausência de guerra; significa muito mais do que isso. Refere-se especialmente ao círculo de ideias relativas ao “bem estar-social”.
Diante da contemporaneidade olhamos para o texto bíblico e somos afrontados a pensar o bem-estar-social que inclui o bem estar individual, pois indica o bem-estar da existência cotidiana, o estado do homem que vive em harmonia com a natureza, consigo próprio, com Deus.

Esboço:
1.       Justiça como obra da paz
“O fruto da justiça [sedaqah] será a paz [shalom], e o efeito da justiça será sossego e segurança para sempre. O meu povo morará em moradas de paz [shalom], em moradas bem seguras e em lugares quietos de descanso.” (Is 32, 17 e 18).
O quadro pintado pelo texto nos indica uma realidade de paz, assim “quando os justos governam, alegra-se o povo”, mas “quando o ímpio domina, o povo geme”. O que estamos vendo hoje é a dor de um povo que está cansado de tanto ser passado para trás. Ninguém aguenta mais tanta injustiça.
Tenho observado os cristãos a minha volta e é interessante ver o comportamento de cada um diante desta realidade. Uns julgam desnecessário, outros dizem que é perda de tempo, outros pensam que todos são desocupados e um bando de bandidos; tem aqueles que acham justo mais não se manifestam; tem aqueles que ainda apoiam os políticos!!!  Mas por acaso alguém aqui vive tranquilo? Você dispõe de segurança? A ponto de deixar um filho seu ir para escola a pé? Você nunca ouviu um disparo de arma de fogo próximo de casa? Você como eu não pagou impostos até agora? Você anda em boas estradas? Pode contar com o serviço de saúde da cidade? Precisou fazer algum exame no serviço público? Foi bem atendido? Alias, seja sincero, a educação esta as mil maravilhas?
Aonde há justiça nisso tudo?! Não há, pois não há governantes justos, o povo anda cabisbaixo, desanimado, frustrado por tanto lutar e nada conquistar. Não vai ser a política do “pão e circo” que vai animar a população brasileira. Chega! Quando falamos de Shalom a imagem que devemos ter é de uma sociedade em plenitude de vida, alicerçada na justiça. Com direitos a dignidade, honra e respeito.
Shalom é a abundância de todas as coisas para todos os humanos. “Eu vim para que tenham vida e vida em abundância”.



2.      Buscando a paz comunitária
“Construí casas e instalai-vos; plantai pomares e comei os seus frutos. Casai-vos e gerai filhos e filhas, tomai esposas para vossos filhos e dai as vossas filhas em casamento, que elas gerem filhos e filhas; multiplicai-vos aí e não diminuais! Procurai a paz [shalom] da cidade, para onde vos deportei; rogai por ela a Iahweh, porque a sua paz será a vossa paz” (Jr 29, 5-7).
A carta escrita pelo profeta Jeremias ao povo de Deus que estava no exílio babilônico (Jr 29) é uma referência importante para um melhor entendimento do significado da palavra shalom. Jeremias, neste texto, apresenta “formas imperativas” na aplicação dos verbos. Pelo menos duas formas paralelas de imperativos guardam uma lógica entre elas.
Na primeira forma, “os imperativos conclamam o povo a uma ação concreta e perfeitamente realizável no presente: construir uma casa, plantar um pomar, tomar uma mulher para si e outra para o filho, dar a filha em casamento, procurar o bem-estar (shalom) do lugar onde mora e orar por ele.” O profeta propôs ao povo encarar o presente buscando vivê-lo na sua integridade. Construam, plantem, comam, gerem, multipliquem, ou seja, ainda que cativos busquem viver suas vidas de maneira plena e digna.
Apesar de estarmos vivendo um mundo tão conturbado e cheio de mazelas ao nosso redor devemos buscar no presente viver de maneira digna. Essa é a diferença que nós cristãos temos das demais pessoas. Não que ficaremos apáticos diante da crise social, moral e econômico de nosso país, mas mesmo diante destas debilidades o profeta nos convida a manter a seriedade, o compromisso com as nossas famílias, igreja, comunidade e cidade.
Já os imperativos da segunda série convidam o povo a fazer algo que está no futuro: “morai nas casas a serem construídas, comei dos frutos que o pomar vai produzir, tende filhos das mulheres que tomardes, multiplicai-vos e não diminuais.
Os imperativos da segunda série não são, exigências, mas promessas de que todo empreendimento do presente terá sucesso. O que plantarmos hoje teremos fruto amanhã!
O ponto alto da carta está no v. 7 com dois novos imperativos: buscai (trabalhai pela...) a paz (shalom); orai pela paz, pois “na paz da cidade, vós tereis a vossa paz”. Além da oração pelo shalom, Jeremias conclama os exilados a buscarem formas concretas para torná-lo visível no cotidiano da cidade (no espaço da pluralidade humana).
Os cristãos devem ser testemunhas e instauradores do shalom, no espaço público. Jeremias aponta algumas pistas pastorais sobre como ser testemunhas do shalom na esfera pública. O profeta demarca um novo referencial para o shalom - a cidade - (espaço da pluralidade), pois, na construção da cidade, na coexistência humana, o shalom se corporifica.
Quando a nossa nação clama por justiça vemos a sede das pessoas, é inadmissível a Igreja de Jesus ficar apática diante deste grito de socorro!
É hora de reavaliarmos nossa postura como igreja. Sair das quatro paredes e se reinventar como espaço de coletividade, pois não é isso a igreja? Um espaço da comunidade que busca a justiça de Deus em suas vidas e na sociedade?

Conclusão

A proposta da shalom torna-se numa motivação a mais para nós cristãos nos inserirmos no espaço público. Somos desafiados a participar na obra da proclamação da justiça de Deus, através da vivência da fé cidadã.
E nós cristãos evangélicos, protestantes temos muito o que ajudar nesse momento de transição e transformação das estruturas sociais de nosso país. Historicamente o protestantismo trouxe um grande impacto social na Europa, a reforma foi um exemplo disso.
A ênfase do entendimento social de Lutero era para que os necessitados fossem amparados. Para ele, o cristão justificado se torna livre para poder, através da fé, viver uma vida de serviço decorrente do amor a Deus. O crente justificado deve pensar como Lutero: "Me [entregarei] ao meu próximo como Cristo se ofereceu por mim; farei nada por meu próximo nesta vida senão o que reconheço como sendo necessário, edificador e saudável, porque pela fé gozo uma abundância de todas as coisas em Cristo".
Um dos mais importantes amigos e colaboradores de Lutero foi Filipe Melanchthon. Este lançou os fundamentos da escola elementar popular. Ele propôs a divisão dos estudantes em três classes, divididas em faixas etárias. Na primeira divisão, as crianças estudavam o alfabeto, a oração do Pai Nosso e o Credo dos Apóstolos. Na segunda divisão, eram estudados pelos adolescentes o Decálogo, o Credo e o Pai Nosso. Os Salmos mais fáceis (112, 34, 128, 125, 133) deveriam ser decorados, assim como deveriam ser estudados o Evangelho de Mateus, as epístolas de Paulo a Timóteo, a primeira epístola de João e os Provérbios de Salomão. Tudo isto lado a lado com o estudo de física, lógica, gramática, moral e história. No último nível (o equivalente à faculdade), os estudantes deveriam se dedicar ao latim, gramática, dialética, retórica, filosofia, matemática, física e ética.
 Melanchthon entendia que Cristo tinha colocado toda a cultura debaixo de Seu controle, acreditando que este entendimento impediria os cristãos de viverem vidas grosseiras, enquanto, ao mesmo tempo, os impediam de atribuir mais importância à cultura humana do que à fé cristã. Segundo ele disse: "Aplico-me a uma coisa, a defesa das letras. Convém que com o nosso exemplo se inflame a mocidade de admiração pelas letras, e que as ame por amor delas, e não pelo proveito que delas possa tirar. A ruína das letras traz consigo a desolação de tudo o que é bom: a religião, os costumes, coisas divinas e coisas humanas. Quanto melhor é um homem, tanto maior é o ardor que tem por salvar as letras; porquanto sabe que das pestes a mais perniciosa é a ignorância. Uma escuridão terrível cairá em nossa sociedade, se o estudo das ciências for negligenciado". Melanchthon tem sido considerado o fundador do ensino controlado e sustentado pelo Estado, tendo tirado as escolas do controle privado.
João Calvino foi um dos mais notáveis reformadores, e a ação social estava entre as suas principais preocupações. Ele tinha como princípio básico nesta área que em Cristo não há mais nem escravos nem livres, pois nosso Senhor aboliu todas as divisões de classes.
Isso significa que o cristão vive a fé autêntica quando encontra seus irmãos numa fraternidade que exclui toda discriminação. Calvino jamais estabeleceu uma conexão entre riqueza ou pobreza e o favor ou desfavor de Deus em relação a indivíduos. Antes, ele entendeu a riqueza e a pobreza como expressões do favor ou do julgamento de Deus sobre toda a comunidade, que então deveria redistribuir os seus recursos com vistas ao bem comum: "Por que é então que Deus permite a existência da pobreza aqui embaixo, a não ser porque ele deseja dar-nos ocasião para praticarmos o bem?"
André Biéler resume o pensamento do reformador: "Somos todos ricos em relação a alguém. O rico tem uma missão econômica de providenciar ao mais pobre parte de sua riqueza, de tal maneira que o pobre deixa de ser pobre e ele mesmo deixe de ser rico".
Se desejamos e ansiamos por um avivamento devemos levar em consideração a paz da nossa comunidade, a nossa paz pessoal será o fruto da paz coletiva. Lutando pela causa do coletivo você luta pela sua paz! Busque a paz, busque a Justiça no Brasil.

BRASIL, DE AMOR ETERNO SEJA SÍMBOLO
O LÁBARO QUE OSTENTAS ESTRELADO,
E DIGA O VERDE-LOURO DESSA FLÂMULA
-PAZ NO FUTURO E GLÓRIA NO PASSADO.
MAS, SE ERGUES DA JUSTIÇA A CLAVA FORTE,
VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO FOGE À LUTA,
NEM TEME, QUEM TE ADORA, A PRÓPRIA MORTE.

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